Live’n’Louder sacode a poeira headbanger em pleno dia das crianças
Evento marcou a volta dos grandes festivais de metal ao Brasil e teve Destruction, Nightwish e Scorpions como destaques. Fotos de Flávio Hopp.
Foi preciso sete anos para que o Brasil voltasse a ter um festival de metal em grande estilo: um dia inteiro num estádio de futebol para o deleite dos fãs da música pesada. A primeira edição do Live ‘N’ Louder Rock Fest aconteceu no feriado do dia 12 de outubro, no Estádio da Portuguesa de Desportos, em São Paulo. Um sol de clarear cabelos, bebida escassa e poucas opções de comida marcaram a estrutura do evento, que brilhou mesmo pelos shows que aconteceram num palco com boa estrutura de luz e som. Mesmo com apenas uma atração inédita no país – o finlandês 69 Eyes – cerca de 24 mil pessoas prestigiaram o evento, que, segundo a produção, deve se tornar anual e até com mais de um dia de duração.
Coube ao Tuatha de Danann fazer a abertura do festival, já com um público bastante grande, e, o melhor, composto por gente que conhecia a banda a um certo tempo. Tanto que boa parte das músicas foi cantada por todos, incluindo os tradicionais braços erguidos e cabeças em transe. Até nas mais recentes, do álbum “Trova di Danú”, foram agraciadas pela platéia. Flautas e arranjos celtas à parte, o grupo mineiro esbanjou competência e carisma, e só pagou um mico ao continuar tocando depois de ter o som cortado pela produção, já que o tempo – controlado com certo rigor - havia sido estourado. Mesmo um tanto fora de cena, o Dr. Sin foi escalado como uma das grandes atrações do festival, talvez pelo chamado “conjunto da obra”. Desse conjunto saíram boa parte das músicas do enxuto repertório, que tinha limite de trinta minutos. Entre elas, destaque para “Emotional Catastrofe”. O som estava tinindo e o trio aproveitou para tocar alguns covers que estarão no próximo disco da banda, só com músicas que tenham a palavra “doctor” no título. Foi assim que rolaram “Doctor Love”, do Kiss (com intro de “Deuce”, também dos mascarados) e “Doctor Rock”, do Motörhead.
DESTRUCTION FAZ SHOW MATADOR
Ver o 69 Eyes adentrar o palco foi algo engraçado, ou mesmo anacrônico. À exceção do baterista (com visual meio hard rock) todos os integrantes vestiam pesadas jaquetas de couro, sob uma temperatura de uns 40 graus, e com o sol batendo no rosto. A banda pratica um gothic metal bem influenciado pelo pós punk à anos 80, não perdeu a pose e fez um show super competente, mesmo não sendo tão conhecida assim no Brasil. Com um teclado fazendo interessantes camas, e guitarras quase minimalistas, o grupo mostrou ser soturno como manda o figurino, mas pop na medida exata, fazendo até lembrar os conterrâneos do HIM. Destaque para “The Chair” e “Feel Berlin” (ambas bem Sisters Of Mercy) e para a dramática “Sister Of Charity”.
Não foi a primeira vez que o Destruction tocou no Brasil, ultimamente esses alemães têm até virado figurinha fácil em São Paulo. Mas esta foi a primeira vez que os açougueiros do metal encararam um sol de verdade. Tanto que estavam corados como camarões. Entre uma música e outra, Schmier aproveitou para detonar subgêneros do metal menos “radicais”, como o melódico, e até o Testament, que cancelou a apresentação, abrindo vaga para o Destruction. Foi o primeiro grande show do Live ‘N‘ Louder, com destaque para clássicos do naipe de “Curse To Gods”, a emblemática “Thrash Till Death” e ainda músicas novas como “Soul Colector”, tudo velocíssimo. Foi o primeiro show em que o Corpo de Bombeiros proporcionou o tradicional banho de mangueira, que chegou até a formar um belo arco-íris. O clássico thrash metal tocado pelo Destruction despertou um grande revival na platéia, onde se via gente muito nova usando um visual típico da década de 90: calças pretas de boca apertada, tênis de couro cano longo e camiseta branca sob colete preto, tudo bem surrado.
Sobrou para o Rage segurar a ressaca do show do Destruction, e a coisa não foi mole, não. Primeiro porque o som começou ruim. Depois, porque a banda, hoje, faz um som bem diferente do praticado no passado, bem mais próximo de um power trio à Rush, e, no show, os dois repertórios - antigo e novo – não se comunicam muito bem. Tanto que, num tempo tão curto, o grupo ainda reservou espaço para solos de guitarra (que animou bastante) e de bateria, este um dos melhores que já se viu nos últimos tempos, com Mike Terrana esbanjando criatividade. Ainda assim, vale destacar a boa “Down” e “Higher Than The Sky”, mesmo com o público fazendo um corinho apenas razoável, no encerramento do show. Já o Shaaman, equivocadamente escalado após bandas de renome, se valeu de toda a popularidade em sua terra natal. Mesmo com um tempo curto, o grupo ainda tocou algumas músicas do Angra, como “Lisbon”, por exemplo, mas também concentrou as forças nas músicas de seus dois discos, o último mais conciso e menos melódico. Agradaram o público “For Tomorrow” e o cover para “More”, do Sisters Of Mercy, numa noite apenas razoável para Andre Matos e cia.
NIGHTWISH E SCORPIONS JUSTIFICAM A CONDIÇÃO DE HEADLINERS
Antes de completar um ano desde a última visita, o Nightwish “teve” que voltar, desta vez para tocar num cenário com o qual a banda já está acostumada na Europa: como uma espécie de semi-headliner e para um público que o faz sentir completamente “em casa”. E é muito interessante ver o crescimento da banda que fez o primeiro show no Brasil em 2000 para um Tom Brasil nem tão concorrido, e agora encontra um público gigante que nada deve aos de outros países. O repertório variou um pouco em relação aos shows do ano passado, mas estavam lá o hit “Nemo”, a épica “Ghost Love Score” e “Wishmaster”, além de um cover para “High Hopes”, do Pink Floyd. Com o baixista Marco Hietala participando mais nos vocais, uma exuberante Tarja Turunen pode evoluir no palco, exibindo inicialmente um manto bordado em amarelo, e, no bis, toda de branco transparente, com o detalhe de ter os microfones sempre com cor em sintonia com as roupas. O final, com “Wish I Had An Angel”, o hit da vez, foi o delírio para o público.
Mas a atração principal era mesmo o Scorpions, medalhão que ocupou este lugar com a desenvoltura de sempre, ainda mais agora, na turnê do álbum “Unbreakable”, no qual a banda voltou a investir no rock pesado de origem, mas em sintonia com os nossos tempos. Tanto que as músicas novas, tocadas em grande parte na primeira metade, como “Generation” e “Love ‘Em Or Leave ‘Em”, não destoaram do apanhando de grandes sucessos que viriam na seqüência. Há que se notar, também, como o trio remanescente da formação clássica – Klaus Meine, Matthias Jabs e Rudolf Schenker – mantêm as sensacionais coreografias que marcaram a banda em todo esse tempo, e indispensáveis num show de rock. O auge dessa performance acontece na estonteante instrumental “Coast To Coast”, com eles três e ainda o baixista Pawel Maciwoda erguendo as guitarras na beira do palco para o público. Outras músicas que agradaram foram as babas “Still Lovin You”, “Holliday” e “Wind Of Change”, mas o ponto alto foi mesmo “Rock You Like a Hurricane”, com final de “Hurricane 2000”, a versão com participação da Orquestra de Berlim. O Scorpions ainda voltou ao palco duas vezes, para encerrar um show ótimo, pena que com duração de pouco mais de hora e meia.
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