De casa nova, Ruído mostra panorama do mercado independente nacional
Festival iniciou nova fase no Teatro Odisséia com o pé direito: casa lotada em dois dos três dias, shows clássicos, novas bandas e muita troca de informação. Fotos: Luiz Lima.
Para um evento que há cinco anos começou pequeno, em pleno Carnaval e com poucas bandas de fora da cidade, o Ruído Festival, que aconteceu entre os dias 10 e 12, no Rio, tem muito que comemorar. Nesta quinta edição, 17 bandas tocaram, grande parte de fora, um segundo palco foi usado pela primeira vez, e muita gente (literalmente) pagou pra ver. Segundo a produção do festival, cerca de 600 pessoas estiveram no Teatro Odisséia na sexta e no sábado, e, no domingo, aproximadamente 300. No andar de cima, além de um palco meio improvisado, foram exibidos documentários sobre a cena independente nacional, e uma verdadeira feira de gravadoras independentes que garantia o do aluguel. No domingo um debate discutiu as condições de trabalho dos independentes num país tão grande como o Brasil.
BANDAS MAIS NOVAS SOBREVIVEM AO PALCO DE CIMA E VANGUART SE DESTACA
Na casa nova, uma novidade: a estréia de um segundo palco, no andar de cima do Teatro. Um desafio a mais para as bandas escaladas para o início de cada noite, já que o local, repleto de mesas e cadeiras, mas parece um restaurante. Isso sem falar na péssima qualidade de som e luz, e do tal palco ser praticamente no nível do piso. Ali, o destaque do festival ficou por conta o cuiabano Vanguart, no sábado. Uma banda simples e até inexperiente, mas que tem boas composições, sabe o que quer e conta com um vocalista que tem intimidade com o palco. O grupo tem tudo para desenvolver o pop/indie rock ainda insipiente; precisa definir se canta em inglês ou português e de um pouco mais de estrada.
Outro que foi bem naquele canto do Teatro foi o Violentures, no domingo, mas isso não é novidade. Mesmo só agora lançando o primeiro disco, “Garage Busters”, os caras já têm boa rodagem para se garantir sob condições adversas. Na mesma linha, o Dead Rocks começou meio desorientado na sexta, mas logo cativou o pequeno público. A surf music multifacetada do trio, que estreava um novo baixista, se mostrou um eficiente elemento de conquista.
Misturando indie rock inglês com raízes interioranas do Paraná, o Charme Chulo, mesmo tendo à frente um vocalista tipo “Morrissey da roça”, pouco acrescentou em relação às suas referências. Parece faltar uma medida à esta experiência O mesmo aconteceu com o Headphone, que repetiu gêneros conhecidos, e não mostrou boas músicas. Pior foi o Tchopu, que inexplicavelmente tocou pela segunda vez seguida no Ruído e não soube prender o pequeno público de domingo.
GRAFORRÉIA SE REPETE E CANASTRA OLHA PRA FRENTE
No palco de baixo (um palco de verdade) as atrações ditas principais não decepcionaram. Graforréia Xilarmônica, Canastra, MQN, Nervoso e Zefirina Bomba fizeram os melhores shows. O Canastra parece mesmo bem à vontade para apresentar as músicas que estarão no segundo disco (como “Motivo de Chacota”, por exemplo), e várias delas prometem. Juntando a isso a performance de palco cada vez mais feroz do grupo e a inclusão – ao que parece, definitiva – do duo de metais, muita coisa boa ainda deve vir por aí. Foi o momento do festival em que o Teatro Odisséia esteve mais cheio. Em segundo lugar, em termos de público, ficou o Graforréia, mas com uma proposta totalmente revivalista – só uma música nova, “40 Anos”, entre as 26 do set. Um mero detalhe para fãs de longa data e que têm poucas oportunidades de ver esse clássico do rock nacional dos anos 90. Teve gente que saiu batido do show do Lobão, que acontecia ali ao lado, no Circo Voador, para ver os caras. Um show clássico, enfim.
Já o MQN, tocando na madrugada de domingo para segunda, não teve tanto público assim – pior para quem não foi. O grupo teve de longe o melhor som do Ruído, e massacrou a platéia com riffs pesados e cativantes. Já há tempos o visual vermelho “from hell” foi abortado, mas o show em si não retrocedeu um milímetro sequer. Uma música nova, “Buzz In My Head”, foi apresentada entre as já conhecidas dos dois discos anteriores. Nervoso, enfim, depois de muito se repetir e lançar um disco e remixes, parece interessado em dar um passo à frente. No show do Ruído, seu grupo mandou várias boas músicas novas. “Candidato a Amigo”, inclusive, é uma já bem conhecida. Foi o show perfeito que aqueceu o público da Graforréia.
Quem completou o primeiro time dos melhores shows foi o Zefirina Bomba, um trio porra-louca cujo principal mérito é o de converter um violão em guitarra, através de distorções pouco comuns para um instrumento essencialmente acústico. O grupo conta a história do rock fundindo passado e presente, buscando o futuro. Um final arrebatador com citações a Pink Floyd e o tal violão/guitarra esfacelado no chão garantiu os aplausos.
RÁDIO DE OUTONO E SAPATOS BICOLORES MOSTRAM POTENCIAL
Das mulheres que invadiram o palco no domingão, quem se deu melhor foi Bárbara Jones, a charmosa vocalista do Rádio de Outono. Mais solta em relação a outros shows, ela conduziu a banda a uma bela apresentação, repleta de prováveis hits resgatados diretamente da new wave oitentista. Só fica faltando mesmo a banda admitir um guitarrista, senão não dá. Mais cedo o Drosóphila também fez das suas, com um show de pop rock pesado e ao mesmo tempo dançável e de bom contágio junto ao público. A banda também pouco acrescenta, mas tá valendo. O Lava parece vir com um carimbo “made in São Paulo”, graças ao visual “Forgotten” de boa parte da banda. Talvez pela pequena platéia de domingo, os integrantes não tivessem muito empolgados. Ainda assim o público curtiu, sobretudo num cover grunge que muito tem a ver com a banda.
O Sapatos Bicolores, de Brasília, completou a noite “jovem guarda” do sábado, emplacando músicas que foram surpreendentemente cantadas em coro pelo Odisséia. É verdade que o rockabilly – já no nome - também bate forte na lista de referências da banda, mas o forte deles são mesmo as boas composições. Na rabeira do festival ficaram os Irmãos Rocha, cujo rock engraçadinho mal foi percebido na alta madrugada de sexta para sábado por uns gatos pingados; e o Jumbo Elektro, espécie de Cansey de Ser Sexy de calças compridas, praticamente só fez playback. Lamentável.
PLACAR DO HOMEM BAILE
Sexta, dia 10
Charme Chulo: abriu o festival em péssimas condições, mas até que foi bem. Nota 7
The Dead Rocks: meio sem jeito no início, acabou saindo aplaudido. Nota 7
Canastra: um dos melhores shows do Ruído 2006. Nota 9
Jumbo Elektro: quando o som de uma banda é idêntico ao som mecânico, sua existência não se justifica. Nota zero.
Zefirina Bomba: quem converte um violão numa guitarra só pode ter boas intenções. Nota 7
Irmãos Rocha!: não disse ao que veio. Nota 5
Sábado, dia 11
Headphone: uma boa banda, mas que pouco acrescenta. Nota 6
Vanguart: a revelação do festival, mas que ainda precisa se desenvolver. Nota 8
The Pop’s: intruso num festival de bandas novas, deu chilique por causa do atraso e não tocou. Nota zero.
Nervoso & Os Calmantes: parece finalmente que vai sair do lugar. Nota 8
Sapatos Bicolores: boas músicas, boas letras, bom público. Nota 7
Graforréia Xilarmônica: clássico é clássico. Nota 8
Domingo, dia 12
Tchopu: com muitas baladas, não soube segurar o público. Nota 4
Violentures: outro que superou as dificuldades do palco de cima. Nota 7
Lava: pareceu desanimado, apesar de ter um público só seu. Nota 6
Drosóphila: boa banda que deve também crescer. Nota 6
Rádio de Outono: mesmo sem guitarrista, mostrou que está evoluindo. Nota 7
MQN: rock de verdade. Nota 8
Tags desse texto: Canastra, Charme Chulo, Drosóphila, Graforréia Xilarmônica, Headphone, Irmãos Rocha!, Jumbo Elektro, Lava, MQN, Nervoso, Rádio de Outono, Ruído Festival, Sapatos Bicolores, Tchopu, The Dead Rocks, Vanguart, Violentures, Zefirina Bomba