Rock é Rock Mesmo

O hard rock, os festivais internacionais, os alvissareiros, o porco de Roger Waters e o óbvio que cega

O mundo globalizado e a internet tiraram de vez as vendas e escancararam o óbvio. Descubra como e por que.

Meus amigos, devo dizer que sou a favor do hard rock. Porque, onde há hard rock, há a alegria. E não é de hoje que faço a defesa do subgênero do rock mais esculachado de que se tem notícia. Sou contra, entretanto, a enganação, o embuste, a empulhação. Mesmo que ela esteja envolvida com coisas legais, coisas que a gente não tem como não gostar. Como o hard rock, por exemplo. Digo isso porque não é possível o ruim ser defendido como o bom, como a coisa rara, se é que vocês me entendem.

Começo essa coluna assim, em pleno dia do trabalhador, trabalhando como nunca – novidade… Mas admito que o assunto é outro. Vejam vocês que ainda há pouco bateu o telefone, e no que fui atender, estava do outro lado o meu amigo Moderninho de Plantão. Mal disse alô e já comecei a me preparar, me ajeitando entre as almofadas da sala aqui de casa - o telefone é daqueles sem fio – para escutar as histórias de meu amigo de longa data. Não que estivéssemos sem nos falar há muito tempo, mas sabia que ele, pela primeira vez, iria ao Coachella Festival, que, de uns tempos para cá, se transformou no grande oba-oba indie entre os quetais de meu amigo aqui no Brasil. Nos poucos segundos em que trocávamos os cumprimentos protocolares, imaginava o amigo radiante. No que, súbito, levei um balde de água gelada contra as ventas.

- Não fui ao Coachella, não. A programação desse ano estava muito caída, démodé, disse Moderninho.

Não foi só a sua desistência que me causou estranhamento, mas a explicação que se seguiu ao anúncio. Se Moderninho está achando o line up do Coachella ruim, das duas uma: ou ele está ficando velho ou o festival já não é mais aquele. Eu já tinha, a título de curiosidade e por força da profissão, olhado, de longe, por alto, quais bandas iriam tocar no afamado festival, que aconteceu na cidade de Indio, na Califórnia, no último final de semana. Indio, sem acento no “i” mesmo, entrou para o mapa por causa o festival, que começou a acontecer em 1999, mas só ganhou fama por aqui em 2004, quando o reunido Pixies, que depois passaria por Curitiba, tocou por lá. Fazer reunião de grupos dinossauros, mas que um dia foram vanguarda, é uma das especialidades do festival. Foi assim também com Jane’s Addiction (2001), Siouxsie & The Banshees (2002) e Iggy Pop And The Stooges (2003), só para se ter uma idéia.

Mas falava da programação que fez meu abastado amigo desistir de dar um pulinho ali, na Califórnia. Nos três dias, uma pá de bandas modernas, a vanguarda da música pop, mas, também, emos, rappers, Scars On Broadway (metade do System Of a Down), bandas que não são bandas, uma pá de anônimos maravilhosos e veteranos como Prince e… Roger Waters. Usei as reticências para dar certo suspense porque este foi, em suma, o motivo que fez o meu amigo Moderninho de Plantão desistir de voar para a famosa – famosíssima – Indio sem acento.

Nossa conversa se estendeu por outros assuntos, rock, música, rock, novidades, rock e a vida em geral, mas foi nesse pedaço que começou a brotar mais uma Rock é Rock Mesmo. Ouvia-o falar e falar e não parava de pensar em escrever esta coluna – o que faço agora. Meu amigo Moderninho ficou fulo da vida ao saber que Roger Waters iria se apresentar no Coachella Valley Music and Arts Festival – eis o nome completo do convescote. Mais: Roger Waters tocaria a íntegra do álbum “Dark Side Of The Moon”, tido como o disco de rock mais vendido da história, além de grandes sucessos de sua ex e irreconciliável banda, o Pink Floyd, que lançou o tal disco, acreditem, em 1973.

Foi demais para meu amigo. Primeiro, que o mesmo Roger Waters esteve aqui, no Rio e em São Paulo, há pouco mais de um ano, em março de 2007, apresentando exatamente o mesmo show, sem tirar nem por. Registre-se que, na época, o evento ganhou o desprezo de Moderninho e quetais. Depois, porque, para Moderninho e quetais, não é possível qualidade no rock feito há mais de seis meses, quiçá há mais de três décadas. Foi demais para ele, mas não para o Coachella, que jorrou gente pelo ladrão, segundo consta, durante os três dias, para a alegria de todos. A curiosidade bizarra ficou por conta do desaparecimento do lendário porco inflável usado por Waters desde os tempos do Pink Floyd, que se desprendeu das cordas e desapareceu, só sendo recuperado dois dias depois, em pedaços. Se fosse no Brasil, imaginem o que diria a mídia internacional… Ao menos a produção do Coachella recompensou os dois casais que acharam os restos do porco com uma boa grana e quatro ingressos vitalícios para o festival.

Disse isso tudo porque, por aqui, volta e meia alvissareiros transformam um evento internacional na Meca da música de vanguarda de todos os tempos, e ignoram que grandes bandas desprezadas por esses mesmos falastrões volta e meia tocam nesses mesmos eventos. Roger Waters no Coachella, Iron Maiden e Metallica no Reading são só alguns exemplos recentes de que a visão global lançada sobre o rock não é provinciana como a propalada por aqui. Foi-se o tempo em que nos enganávamos todos. O que se aplica, também, para a alegria do hard rock citada lá em cima. Hoje, mundo globalizado e internet tiraram de vez as vendas e escancararam o óbvio. Aquele que, de tão óbvio, ás vezes cega.

Até a próxima e long live rock’n’roll!!!

Tags desse texto: ,

Comentário

Seja o primeiro a comentar!

Deixe o seu comentário

Seu email não será divulgado