Vinil? Não, obrigado
Com a evidente banalização do CD, indústria da música quer ressuscitar o vinil para voltar a faturar como nos bons tempos
Meus amigos, trabalhar dá um trabalho danado. Pode ser a coisa mais importante do mundo ou um reles texto falando sobre nada. Que dá um trabalhão, isso dá. Não sei se me faço entender, mas é preciso encarar a coisa de frente, matar um leão por dia. Porque, acreditem, escrever é de amargar. E a frase não é minha. É de Otto Lara Resende, amigo do Mestre. Já devo tê-la citado por aqui em uma das 253 colunas que já publiquei, mas certamente não vou me lembrar. Falei do número só pra vocês terem a dimensão do trabalho. Não é mole, não.
No que escrevo essas linhas ouço o novo álbum do Voivod, “Infini”, na web, inteiramente de graça. A própria gravadora do grupo é quem liberou a bagaça, no tal do streaming. É um jeito que você pode ouvir quantas vezes quiser sem pagar nada, mas não pode baixar para o seu computador. Funciona assim o MySpace.com também, o mais famoso site de relacionamentos onde se pode postar arquivos de áudio e vídeo. Assim o sujeito vê se é bom e depois decide se vale comprar. Alguém ainda consome CD?
Eu consumo e prezo muito ter um disquinho em mãos, com encarte, cheiro de encarte e tudo. Não sou, entretanto, a favor do vinil. Acho uma das coisas mais atrasadas de que se tem notícia. Imagine aquela agulha metálica deslizando sobre sulcos de plástico, cobertos por uma tampa de acrílico transparente, só pra gente tentar ouvir boa música. Atrito o nome já diz. Produz um ruído do cão. Sem falar que o som que sai dali, amplificado, eleva esses ruídos, essa esfregação de aço com plástico a um nível insuportável. Dei graças a Deus quando o CD chegou e eu, sempre mais tarde, pude adquirir o meu e renovar minha coleção de discos.
Mas, porém, entretanto, contudo, todavia, nem tudo no vinil é ruim. A capa é um espetáculo de trabalho gráfico, por conta de suas dimensões, praticamente um pôster. Se dupla, então, é pra ficar olhando enquanto se escuta o disco. Se vem com letras, dá até pra acompanhar, porque as do CD são sempre pequeninas. Outra coisa boa do vinil? O som, que tem muito mais graves, sem nenhum ajuste, do que o CD. E olha que, embora não seja um cabra exigente com esse tipo de coisa, meus ouvidos cambaleantes já desenvolveram uma espécie de anticorpo que detecta a diferença. Tá bom de vantagens para o vinil?
Porque bom mesmo é o CD. Tem o tamanho ideal para se carregar, é fácil de guardar, e, o melhor, o leitor óptico reproduz a música com uma clareza cristalina. O problema são os graves que faltam, mas isso não ocorre com todos os discos, e dá pra ajustar em qualquer equipamento chulé – alguns até têm um botão para aumentar o grave diretamente, sem ajuste. Não resta dúvida de que a qualidade de som, que é o que importa, é melhor no CD. O problema é que banalizaram tanto o pobrezinho nos últimos tempos, que ele, assim como a indústria fonográfica de uma firma geral, está cada vez mais sem valor. A saída, então, é ressuscitar o vinil, cobrar bem caro por ele e voltar a faturar. Vinil, aliás, também não pode ser gravado em casa, e aí já viu. Nessa eu não caio, meus amigos.
O leitor de longa data já deve estar me estranhando. Achando que estou mais anacrônico do que nunca. Sim, meus amigos, esse tipo de discussão não deveria mais caber aqui, nesse 2009 que já chega à sua metade na semana que vem. Esse era um assunto corrente há mais de vinte anos, quando fãs de rock (e da música) decidiam se iriam substituir suas coleções de vinil pelo CD. A indústria decidiu pelo CD e faturou um bocado, até que o tempo passou e os avanços tecnológicos nos trouxeram a era da informação. Ou, melhor, da livre circulação da informação. E, agora, o resultado é que o CD, banalizado, repito, não vale mais nada. E querem trazer o vinil de volta, aquele que a gente não pode mais gravar em casa. Dá pra acreditar?
Explico. Escrevo isso motivado por um programa de TV em que se debatia a volta do vinil, em substituição ao CD, na mesma emissora que um dia, por decreto, determinou o fim do videoclipe. A conversa ia bem, até que, depois de todos os convidados falarem, percebi que não havia ali um único defensor do CD. Estava o formato a ser condenado publicamente no programa e por toda a sua audiência por TV e on line, sem ter o sagrado direito de defesa que, por lei, é obrigatório até ao mais facínora entre os criminosos. E que crime cometeu o CD? O de ficar barato demais e acessível a todos, de modo que não se pode mais ganhar dinheiro com ele. E se não dá lucro, não tem valor. Cruel, meus amigos, muito cruel, diria Januário de Oliveira. E nem vou falar do famoso “outro lado” jornalístico, porque aí já seria exigir muito da tal emissora.
Falava de qualidade de som e de imagem, mas sabemos que hoje isso caiu em desuso. Milhares de pessoas assistem a clipes meia boca no youtube e escutam músicas mal gravadas em mp3 e acham o máximo. Deixou de ser prioridade a excelência perseguida pela indústria de equipamentos sonoros para se dar valor ao imediatismo fugaz de se ver, ouvir, enfim saber, antes. Às favas com a qualidade. É num cenário desses – e só nele – que uma geringonça como uma vitrola de leitura eletromecânica pode triunfar. Para o bem dos bolsos da indústria fonográfica. Pra cima de moi, não.
Até a próxima, e long live rock’n’roll!!!
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