O Homem Baile

Filé para poucos e picadinho para a massa

Numa inversão de valores, as atrações principais do Grito Rock tocaram para um público menor que os grupos intermediários; encontro de Macaco Bong e Emicida foi curto, e cada qual fez muito bem a sua parte. Fotos: Luciano Oliveira.

O guitarrista Bruno Kayapy e o rapper Emicida, no encontro que -ainda bem - só durou uma música

O guitarrista Bruno Kayapy e o rapper Emicida, no encontro que - ainda bem - só durou uma música

Eram quase 4h30 da matina desta sexta quando Bruno Kayapy deixou a guitarra falando sozinha no piso do palco do Circo Voador, em frente a bravos 47 fãs contados a dedo. Era a senha para o fim de uma maratona com sete bandas que se apresentaram numa única noite na versão carioca do Grito Rock deste ano. O planejamento atabalhoado da produção do festival – se é que houve – não deu certo e fez o Macaco Bong, atração principal, tocar para um “público” inferior ao da banda de abertura (Cabrones Sarnentos), que iniciou a noite somente às 21h30. Os números não mentem, e matemática cruel apontava para a incrível inversão de valores.

O Vivendo do Ócio aposta nas guitarras e melhora

O Vivendo do Ócio aposta nas guitarras e melhora

O Macaco Bong nada a tinha a ver com isso e optou por tocar todo o repertório que planejara, numa espécie de tributo e castigo ao mesmo tempo a quem teve pernas para acompanhar tudo até o fim. O set incluiu duas músicas novas, com Kayapy tocando slide guitar sentado e com a guitarra no colo, curiosamente usando o dedal fora do dedo. A façanha revelou uma face oculta do guitarrista, que mergulhou nas raízes do blues, sobretudo em “Morangotango”, uma delas. No restante do show o trio mostrou as músicas do álbum “Artista Igual a Pedreiro”, dessa vez citando riffs de “Black In Black”, do AC/DC e de “Killing In The Name”, do Rage Against The Machine. A participação de Emicida no show do trio virtuose se resumiu a apenas uma música, um heavy/soul/funk da pesada - até que não ficou ruim.

Pensem bem. A única coisa que um trio instrumental com o maior guitar hero do Brasil precisa é de um vocalista, muito menos um rapper; DJ, então nem pensar. Cada coisa no seu lugar. Emicida, de seu lado, deu o recado direitinho, ganhando o público muito mais no carisma e na simpatia do que por apresentar algo novo ou relevante para o segmento. Ele toca acompanhado de um DJ monótono que bem que poderia dar um “play” e ir tomar uma cerveja no backstage. Se o Macaco Bong não carece de um cantador, o Emicida, que fez no Grito Rock do Rio o penúltimo show antes de partir para uma turnê internacional, bem que podia refletir sobre ter uma banda de verdade a escudá-lo.

Tereza: vocalista é símbolo da evolução do grupo

Tereza: vocalista é símbolo da evolução do grupo

Mas não foi o rapper o que de pior aconteceu no festival. É de impressionar como o Holger regrediu horrores em pouco tempo. De banda indie dance promissora, se transformou numa espécie de Vampire Weekend do Tietê. O grupo promove uma suruba musical estéril em que todos os que estão no palco se revezam nos instrumentos e fortalecem a máxima segundo a qual nenhum deles toca bem instrumento algum. Influenciados pela micareta indie, eles conseguiram a façanha de reunir, num lugar só, tudo que o indie tem de pior: a inclusão de batucada pra turista; o flerte com o tecnopop oitentista, só que mal feito; a dancinha de indie bobo alegre sem jeito; e o flerte com subgêneros de gosto questionável, com sua própria dança do creu, só para citar alguns predicados dessa verdadeira antibanda.

Há, no entanto, quem melhore. O Vivendo do Ócio, por exemplo, deixou de lado os reflexos de Strokes e afins e agora toca pesado e com ênfase nas guitarras. O palco tem feito bem para os caras. Coube ao baterista substituto, do Sugar Kane, já que o original tá com a mão quebrada, contribuir decisivamente sentando braço sem dó. E o grupo baiano tem lá seus fãs e alguns hits cantados pelo público, caso de “Rock Pub Baby” e “Terra Virar Mente” e seu belo riff. Agora só falta mesmo o quarteto investir na canção; uma música igual à outra não dá. O Tereza aproveitou a oportunidade de tocar em duas edições seguidas do festival para mostrar que também tem melhorado e, por isso mesmo, tem lá seu séquito de seguidores. O grupo, que era do tipo “banda de baile”, fazendo de cada música uma amostra de um subgênero do rock, agora parece mais centrada numa só direção – gostem ou não. Nessa nova fase, o grupo aposta (também) no rock pinçado lá dos anos 80, e tenta lhe dar uma cara própria. Até a paisagem do palco mudou, com menos afetação e mais rock. As aulas de presença de palco as quais o vocalista se submete estão dando resultado.

Cabrones: mais público que o Macaco

Cabrones: mais público que o Macaco

Quem primeiro ajuntou uma boa quantidade de público no Circo foi o Medulla, o segundo da noite. Só que os gêmeos Keoops e Raony, que lideram a banda, estão cada vez mais “diferentes”, no que tange ao modo de se vestir e à presença de palco – um deles, com a perna contundida, foi prejudicado. Eles são escoltados por uma boa banda que toca rock pesado cheio de groove, e, como já lançaram disco por grande gravadora e tocaram em rádio, tem hits reconhecíveis como “Munição da Mamadeira”, do refrão “quem tem dedo do lobo mau”, e “Salto Mortal”. Para ficar melhor, os gêmeos poderiam se fundir num vocalista só e deixar de lado a pompa de “artista”, mas aí já é pedir demais. A dura tarefa de abrir os trabalhos foi do Cabrones Sarnentos. Se voltarmos ao início do texto, o grupo tocou para um público maior que o do Macaco Bong e acabou saindo no lucro, mesmo sendo pouco conhecido. A banda volta e meia muda de formação e precisa escalar o mesmo time mais vezes seguida, o que não tira o mérito do psychobilly misturado com punk sujão e Motörhead da melhor qualidade. Procurem “O Filho do Diabo” por aí que vocês vão gostar.

Placar Rock em Geral
Cabrones Sarnentos: 6
Medulla: 6
Tereza: 7
Holger: Sem nota
Vivendo do Ócio: 7
Emicida: 7
Macaco Bong: 9

O Grito Rock acontece hoje em Niterói, com as bandas Holger, Tipo Uísque, Colombia Coffee, The Fraktal e Kapitu – saiba mais aqui.

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Comentários enviados

Existem 4 comentários nesse texto.
  1. Luciano Oliveira em março 25, 2011 às 11:44
    #1

    Holger… um show inesquecivel.

  2. Lee em março 25, 2011 às 14:04
    #2

    Vivendo do Ócio estuprou os meus ouvidos… impossível ser a mesma nota do Emicida. “O inimigo, o inimigo, o inimigo, o inimigo, o inimigo, o inimigo, o inimigo, o inimigo”? Quase me joguei lá de cima.

  3. Erika em março 28, 2011 às 20:03
    #3

    Essa música (sensacional, diga-se de passagem) é da banda do batera substituto do Vivendo do ócio.

  4. Cynthia em março 29, 2011 às 2:18
    #4

    Sério, o Holger faz um dos melhores shows desse país, my friend!
    Não tem como não gostar e não se envolver. E eles só vêm evoluindo. Injusto não dar uma nota.
    Não entendo é esse hype em torno do Emicida, e ainda essa onda de misturar ele no meio rock o tempo todo.
    Garanto que o Holger conquistou muito mais público do que ele e Vivendo do Ócio, que é legal até, mas não tem nada de novo.

    Quanto ao Macaco Bong, sem comentários. Uma das melhores bandas do mundo!

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