Pitty
Setevidas
(Deckdisc)
O quarto álbum da cantora Pitty, “Setevidas”, não é o mais pesado de sua carreira, mas a retomada do peso que fora deixado de lado em duas ocasiões anteriores. Primeiro, quando ela pegou leve em “Chiaroscuro”, de 2009 (resenha aqui), emblematizado pelo hit “Me Adora”. Depois, quando optou, talvez por conta dos problemas internos que levaram a uma grita judicial e resultaram em mudanças na formação, a atuar como um duo com o guitarrista Martin, no Agridoce, o que acabou lhe trazendo – ainda tem mais essa - uma inédita respeitabilidade em setores da intelligentsia da música brasileira. Agora, não. Está de volta – e sejam bem-vindos – a boa e velha banda que se notabilizou por oferecer sotaque pop ao rock pesado dos anos noventa.
Pop no sentido de cativante, porque de banal nada tem este quarto disco, movido à raiva, mágoa, dor, a tal angústia contida citada pela Plebe Rude e, também, redenção e reencontro do artista com a sua própria vocação. Não que seja compactamente um trabalho conceitual e fechado em si mesmo, mas é inegável o combustível armazenado pelas agruras que florescem quando se traça uma carreira de grande destaque no mercadão da música, prontinho para atingir o ponto de fulgor. É o que mostra a faixa-título, siamesa de “Anacrônico” (a música), um belo cartão de visitas no qual a cantora entra de sola como uma fênix que ressurge ante aos problemas que a atormentam. É o artista fazendo uso do que vê ao seu redor na tradução de sua própria arte.
Outro tapa na cara das mazelas humanas é “Boca Aberta”, um rock dos bons no qual Pitty solta o verbo pra cima do inseguro reclamador de plantão que se distribui aos borbotões. Além de um certeiro soco no estômago na imbecilidade, a música, curta, bem arranjada e de alta combustão – de novo -, é óbvia candidata ao segundo single do disco. Ode ao conteúdo e ao trabalho, “A Massa”, de tons mais suaves, é parente próxima de “Boca Aberta” e garante raros momentos de descanso em um álbum denso e – reforça-se – pesado, embora não encaminhado apenas a iniciados. Pitty consegue trazer de volta – repita-se – o modo cativante de se fazer música pesada, o rock traduzido para as massas cumprindo sua vocação.
Musicalmente, além dos truques guardados no caderninho da compositora Pitty que já a colocam no rol dos grandes fazedores de boas músicas, o disco é também, de certo modo, sombrio. Exemplo fácil de pescar é “Lado de Lá”, espécie de despedida oficial do guitarrista Peu, parceiro de início de carreira, que se foi no ano passado (saiba mais). A música é de comovente beleza ao investir em um tom psicodélico e com a inclusão de backing vocals que emprestam certo drama inerente ao tema. Ao mesmo tempo, o precioso arranjo soa como o próprio desfecho da vida, inexplicável por voluntário, mas possível de se perceber visual e fisicamente, em um dos momentos mais fortes do disco.
O olhar quase que totalmente pessoal neste “Setevidas” se explica pela autoria solitária de Pitty em seis das 10 faixas do CD, sendo que a parceria com Martin aparece em outras três e apenas uma faixa, “Olho Calmo”, vem de toda a banda, completada no álbum pelo baterista Duda (na banda desde o início) e o estreante baixista Guilherme, ex-Pública. Outras músicas que se salientam são a nirvânica “Pouco”, que abre o CD em excelente tom; a facinha, mas deliciosa “Deixa Ela Entrar”; e o sotaque puramente pop de “Um Leão”, outra do naipe das boas composições. Movido a raiva como o rock deve ser, “Setevidas” representa a retomada de um rumo que parecia perdido na já longa estrada traçada por Pitty. Só uma semente, contudo - e que assim seja -, do que ainda está por vir.
Tags desse texto: Pitty
A melhor crítica que já li até agora. Sem repetições clichês em torno do nome “Setevidas”, direto e preciso. Assino embaixo!
É um disco difícil, musicalmente está muito maduro, sombrio e reto. A primeira música (”Pouco”) meio que te acende, aí você vai passando as faixas empolgado, pula ao máximo com a faixa 9 (”Setevidas”) e termina o disco com um som perfeito (”Serpente”). É um mantra que tem uma letra ótima, e você termina numa paz, tipo meio trabalho cumprido! Agora é só esperar dia 9/8 pra ver como vai funcionar ao vivo!
A Pitty e sua nada vêm evoluindo muito desde o último disco. As composições das melodias estão cada vez mais a cara da banda, e a influência do Muse e do QOTSA está fazendo muito bem ao grupo. Amo muito o som deles.
Toda vida que falam em rock nacional, sempre vem à cabeça de muitos as bandas dos anos 80 como Legião Urbana. Sem pré conceitos, eu nunca curti. Gosto do som de Pitty, pois acho que ela apresenta um trabalho com qualidade. Coisa difícil de ver aqui no Brasil. Acho que ela se propõe a tocar algo bom.