O Homem Baile

Sem diálogo

Em show de grandes proporções no Lollapalooza, Robert Plant faz ajustes, mas não estabelece contato com uma plateia que, por sua vez, não recebe o que demanda. Fotos Divulgação T4F: I Hate Flash (1, 2) e MRossi (3, 4).

Robert Plant se esforça para interagir com o público, mas não entrega o que ele tanto deseja

Robert Plant se esforça para interagir com o público, mas não entrega o que ele tanto deseja

É louvável que Robert Plant, aos 66 anos, esteja em cima de um palco recriando as canções que também fazem parte da obra dele, em vez de viver o personagem milionário solitário deprimido que não consegue se relacionar com o seu próprio passado. Mas um espetáculo, sobretudo um show de rock em um festival de enormes proporções como o Lollapalooza, depende do outro lado, o do público, que, honra seja feita, é quem paga as contas de todos. E esse público quer ouvir as músicas do Led Zeppelin como Led Zeppelin, mesmo porque o show foi distorcidamente anunciado desse jeito em tudo o que é lugar. Assim, entre artista e público se abre o abismo da falta de comunicação, o que determina o fracasso do espetáculo como um todo.

Por isso a pergunta sobre se Fulano ou Beltrano gostou do show tem sempre a resposta claudicante que indica decepção seguida de uma vírgula que ameniza com um “mas é o Robert Plant, vocalista do Led Zeppelin”. Por isso, não adianta a banda Sensational Space Shifters ter bons músicos que fazem arranjos incríveis e renovados, que eles nunca vão atender à demanda do público. E ainda causa confusão porque a decepção é convertida em avaliação equivocada da qualidade musical/técnica/criativa de cada um ali no palco, incluindo a do próprio Plant. E ainda por isso em geral as interpretações mais elogiadas são as que mais se parecem com as gravadas originalmente pelo Led Zeppelin, como “Going to California” e até “Babe, I’m Gonna Leave You”, que nem é do Led, mas foi ele que a consagrou.

Atitude rock: Plant agita com o pedestal do microfone, junto com o bom guitarrista Justin Adams

Atitude rock: Plant agita com o pedestal do microfone, junto com o bom guitarrista Justin Adams

Robert Plant, na tentativa de recuperar o diálogo que um dia já teve com o público, poderia investir na parte da carreira do Led Zeppelin quando o grupo realçava referências ao country/folk, ali entre os álbuns “Led Zeppelin II” e “Led Zeppelin III”, em vez de ir para o lado de “Black Dog”, só aclamada pelo público no trecho do “ahá, ahá”, ou “Rock And Roll”, incluída no bis de modo infame já no início, sem a icônica introdução de bateria. É bem verdade que para um show de grandes proporções, Plant muda sensivelmente o set list, e a abertura com “Babe I’m Gonna Leave You”, que substitui “No Quarter”, tocada em ambiente fechado em Belo Horizonte e no Rio (veja como foi) é um bom exemplo disso. A inclusão do clássico “Spoonful”, de Willie Dixon também ajuda, mesmo porque, por incrível que pareça, a essa altura, nesse formato – difícil admitir - quanto menos Led Zeppelin, melhor.

Há que se questionar, também, o porquê de a carreira solo de Plant, com uma dezena de álbuns e até alguns hits radiofônicos, ser tão pouco explorada, bem como as músicas já gravadas com a Sensational Space Shifters, no álbum “Lullaby and the Ceaseless Roar”, que saiu no ano passado. São só três desse trabalho, sendo que a melhor segue sendo “Little Maggie”, mais à custa da tecladeira do Massive Attack John Baggott, do que pelo conteúdo pop/afrobeat/juju music pra maluco dançar. Isso realça é em “Rainbow”, outra das novas, e tem discrição quase invisível em “Turn It Up”, a terceira. É notório também, ainda na comparação show intimista versus show de festival, o quanto os músicos se esforçam, além do repertório, para tocar com mais vigor e com uma postura, digamos, um pouco mais agressiva, sobretudo nos casos dos guitarristas Justin Adams e Liam “Skin” Tyson (belo solo em “Spoonful”).

Vista geral do palco do Lollaplooza com a Sensational Space Shifters, liderada por Robert Plant

Vista geral do palco do Lollaplooza com a Sensational Space Shifters, liderada por Robert Plant

Em vão. Talvez por isso mesmo Robert Plant tenha reagido à frieza da plateia em vários momentos do show, com frases do tipo “como é que é São Paulo?”. Mas como exigir do público uma entrega acalorada se ele não recebe aquilo que espera? É o dilema que resulta na ausência de diálogo de parte a parte. As exceções ficam por conta da já citada “Going to California” e “What Is and What Should Never Be”, nas quais o público não só se emociona, como participa mais. E vale o registro de que o gogó de Plant funciona direitinho na maior parte do set, incluindo trechos de alcance improvável para quem tem a rodagem que ele tem. No fim das contas, o que todo mundo sentiu falta mesmo foi da participação dele no show de Jack White (veja como foi), como aconteceu no Lolla argentino. Pena que não rolou.

Set list completo:

1- Babe, I’m Gonna Leave You
2- Rainbow
3- Black Dog/Arbaden (Maggie’s Baby)
4- Turn It Up
5- Going to California
6- Spoonful
7- The Lemon Song
8- Little Maggie
9- What Is and What Should Never Be
10- Fixin’ to Die
11- Whole Lotta Love
Bis
12- Rock and Roll

Plant canta com a imagem do álbum lançado no ano passado ao fundo: só três músicas dele foram tocadas

Plant canta com a imagem do álbum lançado no ano passado ao fundo: só três músicas dele foram tocadas

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