Assim, assim…
Desgastados, irmãos Cavalera revivem era de ouro do Sepultura com boa resposta de público no Imperator, no Rio. Fotos: Nem Queiroz.
Não se trata, tampouco, de uma noite para reviver os dois showzaços que o Sepultura fez neste mesmo local, em 1996 (relembre), como segue o marketing. Porque naquela época a íntegra de “Roots” não foi tocada, o repertório era o que a banda vinha engendrando no auge de suas conquistas mundo afora, sobretudo no mercado europeu; era gigante o simples lançamento de um novo álbum do Sepultura. Consta que eram incluídas mais músicas do álbum “Chaos A.D.”, lançado três anos antes com extraordinário sucesso, do que de “Roots”, um disco realmente revolucionário e que, à época, sintetizava o metal contemporâneo e espalhava referências aos montes, muito bem aproveitadas pelas gerações subsequentes. Daí a importância e razão de ser de uma noite como essa.
E funciona muito bem - diga-se -, a despeito de um álbum em si não ter a ordem das músicas planejadas para um show. Acontece que, além de sucessos consagrados desde os tempos idos, como “Roots Bloody Roots”, o maior de todos, “Attitude”, “Straighthate” e até a inefável “Ratamahatta”, todas as outras músicas são conhecidas do bom público que enche o Imperator, demonstrando como essa turma da plateia ouviu “Roots” ao longo dos anos. A performance da banda, contudo, deixa um pouco a desejar porque Max, na maior parte do tempo, vive de reger o público, dizendo para que façam isso e aquilo – pouco toca -, e Iggor, em significativa melhora da forma física em relação a ocasiões recentes, segue tocando sem a vibração dos bons tempos, quase de modo burocrático. Até Marc Rizzo, o ótimo guitarrista que acompanha Max há anos, parece mais animado que ele, e Tony Campos segura a onda no baixo sem comprometer, como de costume.Isso, contudo, pouco importa para o público, que se diverte sem parar abrindo rodas de dança como nos bons tempos e cantando quase todas as letras na ponta da língua. A vedete é mesmo “Roots Bloody Roots”, que abre o show a todo vapor e encerra noite numa versão ultrarrápida que é pura diversão. “Cut-Throat” recebe um groove sensacional; “Itsári” se converte em um enxuto, mas eficiente solo de Iggor; a sujona “Spit” chama a atenção pelo refrão cantado por todos; “Ambush”, uma das menos aclamadas, ganha uma versão alongada com Max tocando tambor e a inserção mais uma vez do coro da tribo Xavante; e “Jasco”, faixa solo de Andreas Kisser, como era de se imaginar, é a única do disco limada no show.
No bis, em vez de serem tocados outros sucessos da fase Max no Sepultura, como “Refuse/Resist”, “Territories” ou “Dead Embrionic Cells”, por exemplo, na maior parte do tempo o palco é ocupado somente por Max e Iggor, que tocam um medley reunindo, entre outras, “Inner Self” e “Polícia”. A performance, tosca, com Max tocando suas tradicionais quatro cordas com comovente dificuldade, quebra amplamente o clima do show. De certo modo, mostra as raízes do Sepultura não só no sentido de tocar o álbum “Roots” na íntegra, mas de reviver os tempos em que os irmãos, ainda adolescentes, tocavam juntos em casa. A mamãe Cavalera assiste a tudo na lateral do palco, mas, para quem compra ingresso, disco e camiseta, é muito pouco.O show, por fim – e não é de hoje que é assim – é fadado a comparações. Porque, na prática – e não culpem os fãs – existem dois Sepulturas. Um segue a carreira lançando discos com músicas inéditas e fazendo turnês pelo mundo, e o outro está ancorado em projetos revivalistas. Um tem os integrantes em boa forma, mantém a agressividade indispensável ao tipo de música extrema como o thrash metal, e o outro, por vezes, sofre com o cansaço do passar dos anos e parece banda de animação de baile. Um encerra um festival com uma apresentação impecável, como a do Hell In Rio (relembre), mas é o outro que tem aos integrantes fundadores, incluindo o maior expoente do metal nacional no exterior em todas as épocas. É fácil escolher, muito embora todos prefiram um terceiro Sepultura, aquele idílico, que chegou ao topo do mundo, mas que jamais voltará a existir, ainda que a reunião da formação clássica aconteça. Aceitemos, então.
O Incite é a banda liderada pelo enteado de Max, Richie Cavalera, que o músico tem como filho. Ele já tinha participado dos shows do Soulfly no Brasil em 2013 (veja como foi no Rio e em Brasília), e agora traz sua banda para um bom show de abertura. O grupo vai fundo no groove metal e tem especial influência do Pantera, sobretudo nos riffs pesadões que marcam o quarteto; solo só de vez em quando. Richie é bom de palco também, e os vocais rasgados/guturais não negam suas origens. Destaque para “Up In Hell”, faixa-título do terceiro álbum, lançado em 2014, com um bom refrão, reconhecível mesmo embaixo de um esporro danado. Com performance agressiva e pesada, o Incite acabou mostrando muito mais energia que a banda de fundo.Set list completo Cavalera Conspiracy:
1- Roots Bloody Roots
2- Attitude
3- Cut-Throat
4- Ratamahatta
5- Breed Apart
6- Straighthate
7- Spit
8- Lookaway
9- Dusted
10- Born Stubborn
11- Itsári
12- Ambush
13- Endangered Species
14- Dictatorshit
Bis
15- War Pigs
16- Procreation (of the Wicked)
17- Desperate Cry/Innerself/Escape to the Void/Polícia/Orgasmatron
18- Ace of Spades
19- Roots Bloody Roots
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